O universo dos videogames, frequentemente elogiado por sua capacidade de imersão e por transportar jogadores para realidades distintas, ocasionalmente gera debates que transcendem o entretenimento virtual e tocam em questões do mundo real. É o caso de “Ghost of Yotei”, um título que, seguindo os passos de seu aclamado predecessor “Ghost of Tsushima”, inclui uma popular mecânica de interação com raposas. A inclusão desses animais no jogo, desenvolvido pela Sucker Punch Productions, foi vista como uma extensão natural da característica apreciada pelos fãs, dado que as raposas estavam presentes em Hokkaido no ano de 1603, período em que se passa a aventura estrelada por Atsu. (via: thegamer)
Contudo, apesar do prazer que muitos jogadores encontram ao passar horas interagindo com esses amigos peludos no ambiente virtual, a representação levantou preocupações entre alguns residentes da moderna Hokkaido. A apreensão central reside na mensagem potencial que o jogo poderia inadvertidamente transmitir aos fãs: a de que seria seguro interagir e acariciar raposas no mundo real.
A questão ganha contornos sérios ao se considerar a realidade biológica da região. Hokkaido é o lar da raposa-vermelha-de-Ezo, uma variação regional da espécie. Este tipo de raposa é frequentemente portador de um parasita de tênia conhecido como Echinococcus. Se o parasita infectar um ser humano, pode causar uma doença chamada equinococose, que, em casos graves, pode ser fatal. A publicação Automaton, que repercutiu a discussão, destacou a complexidade do debate e a validade das preocupações expressas pelos nativos de Hokkaido.
Em meio a essa discussão, um cientista japonês ofereceu uma perspectiva histórica. Em uma publicação no Twitter, o biólogo elogiou “Ghost of Yotei” pela precisão de sua pesquisa histórica. Ele explicou que a equinococose provavelmente não estava presente na área de Hokkaido antes da década de 1920. Dessa forma, as interações entre o protagonista Atsu e as raposas-vermelhas-de-Ezo no contexto de 1603 não apresentam incorreção do ponto de vista histórico. Ezo, aliás, era o nome pelo qual a região de Hokkaido era conhecida na época retratada no jogo.
No entanto, nem todos se convenceram de que a precisão histórica anula a preocupação. Enquanto ninguém questiona a correção da análise do biólogo, muitos argumentam que a questão principal não é a veracidade histórica, mas sim o risco que turistas desavisados podem correr ao tentar imitar as ações do jogo. Um residente japonês, em resposta à análise do biólogo, ponderou: “Isso não é ‘errado’ de uma perspectiva de precisão histórica, mas se as pessoas começarem a imitá-lo, isso não seria ‘errado’?”
A publicação Automaton também ressaltou que, nas últimas décadas, o Japão tem realizado esforços contínuos para tratar as raposas infectadas. Apesar desses esforços, o parasita ainda está presente na população de raposas. Portanto, a recomendação explícita é para que qualquer pessoa que encontre uma raposa em sua viagem a Hokkaido mantenha uma distância segura, priorizando a saúde pública e a segurança individual. O debate em torno de “Ghost of Yotei” serve como um lembrete vívido da intrincada intersecção entre o entretenimento digital e as realidades ambientais e de saúde do mundo físico.




