Em 1999, o estúdio HotGen, sediado em Londres, recebeu a ambiciosa e desafiadora tarefa de transpor o universo de Resident Evil para o Nintendo Game Boy Color. A magnitude do projeto era evidente: transformar um jogo que ocupava dois CDs de consoles com capacidade de 32 bits em um cartucho de 2 MB para um sistema de 8 bits parecia, à primeira vista, uma missão quase impossível. No entanto, a equipe da HotGen demonstrou uma habilidade notável, conseguindo um resultado impressionante na “redução” de Resident Evil para o portátil da Nintendo. O desenvolvimento progrediu a ponto de o jogo estar próximo da finalização quando, em meados de 2000, o projeto foi subitamente cancelado.
Desde 2011, protótipos e versões em progresso deste port de Resident Evil para Game Boy Color já circulavam na internet. Contudo, mesmo as compilações consideradas mais “completas” até então apresentavam um estado de inacabamento que impedia os jogadores de alcançarem o final da aventura. Agora, o grupo “Games That Weren’t”, dedicado à preservação de jogos não lançados, disponibilizou uma nova compilação, considerada a mais completa possível – refletindo o estado do jogo no exato momento de seu cancelamento. Há uma forte crença de que esta versão permitirá, finalmente, que os jogadores percorram o título do início ao fim.
Pete Frith, programador assistente que trabalhou no projeto e foi o responsável por fornecer esta nova compilação, estima que a versão esteja cerca de 98% completa. Sua avaliação se baseia na intensa comunicação entre a equipe de desenvolvimento e os testadores de controle de qualidade (QA) que ele recorda ter ocorrido pouco antes do cancelamento, sugerindo que o projeto estava praticamente concluído.
Frith também compartilha sua lembrança sobre o motivo do cancelamento. Segundo ele, a equipe da HotGen foi informada de que o “criador original de Resident Evil” não considerava o Game Boy Color um console digno de receber o jogo, ordenando assim a interrupção do desenvolvimento. Não se sabe ao certo se esta referência se dirige a Shinji Mikami, diretor do jogo, ou a Tokuro Fujiwara, produtor que concebeu a ideia original de recriar seu survival horror do NES, Sweet Home.
Esta compilação “final” – sendo a última produzida antes do cancelamento – inclui conteúdos que não estavam presentes em versões anteriores que vazaram. Entre eles, destacam-se a presença do inimigo Tyrant e o final do jogo. Diante disso, acredita-se que seja possível jogar a aventura em sua totalidade. Embora “Games That Weren’t” ainda não tenha testado completamente essa possibilidade, o site disponibilizou modificações (hacks) para que os jogadores possam pular diretamente para a batalha final contra o Tyrant ou avançar para a cena de encerramento, caso a jogatina completa não seja viável.
Apesar de sua proximidade da conclusão, o jogo não está 100% perfeito, e algumas imperfeições persistem. Certas cenas animadas permanecem inacabadas, algumas cores de sprites estão incorretas, e os personagens Wesker e Barry, por exemplo, compartilham os mesmos modelos de sprites. Outro detalhe notável é a animação dos zumbis: ao serem derrotados, eles caem de joelhos em vez de tombar completamente. Não se sabe se essa escolha foi intencional para satisfazer os requisitos da Nintendo, talvez buscando uma representação menos violenta.
Reagindo à notícia de que a versão mais completa do jogo havia sido preservada e compartilhada, o artista Simon Butler, que trabalhou no projeto, comentou: “É bom ver meus sprites novamente depois de todos esses anos. Não foi o projeto mais divertido em que trabalhei, mas foi interessante, para dizer o mínimo.”
Vale ressaltar que o Game Boy Color, de fato, recebeu um jogo da franquia Resident Evil, mas não este port. Trata-se de Resident Evil Gaiden, desenvolvido pela M4 e concebido especificamente para o portátil. Neste título, Leon S. Kennedy explorava um transatlântico em uma perspectiva aérea, intercalada com seções de tiro em primeira pessoa.