A série de jogos Resident Evil, conhecida por suas tramas cheias de reviravoltas e elementos de filmes B, encontra-se agora diante de uma intrigante inconsistência narrativa que tem gerado discussões entre fãs e até mesmo entre seus próprios criadores. O cerne da questão reside no destino da icônica Raccoon City, metrópole que serve de palco para alguns dos momentos mais memoráveis da franquia. (via: thegamer)
No lançamento original de Resident Evil 3: Nemesis, a destruição de Raccoon City foi apresentada de forma cataclísmica. Um míssil termobárico é lançado sobre a cidade, engolindo-a inteiramente em chamas e obliterando marcos históricos como a delegacia de polícia do RPD (Raccoon City Police Department). O epílogo do jogo não deixa margem para dúvidas, afirmando explicitamente que “Raccoon City foi literalmente varrida do mapa”. A intenção era clara: proporcionar um fim definitivo para a cidade e seu legado de horror.
Essa decisão, segundo revelado por Kazuhiro Aoyama, diretor do Resident Evil 3 original, em entrevista ao portal Under the Mayo, não estava nos planos iniciais. Quando Nemesis foi concebido como um spin-off, a equipe não pretendia a aniquilação total da cidade. Contudo, quando o jogo foi elevado ao status de sequência numerada oficial, a Capcom decidiu fechar o capítulo de Raccoon City de maneira conclusiva, buscando um desfecho impactante e irreversível. Aoyama explicou que a intenção era que a cidade fosse completamente destruída, sem deixar vestígios.
No entanto, em Resident Evil 9: Requiem, um título mais recente da franquia, a mesma delegacia do RPD, que deveria ter sido pulverizada, é vista ainda de pé. Além disso, grande parte do horizonte da cidade permanece intacta, embora visivelmente deteriorada e abandonada após anos. Essa representação do cenário deixou o próprio Aoyama perplexo. O portal Under the Mayo, por “cortesia profissional”, não entrou em detalhes sobre as observações de Aoyama a respeito da versão dos eventos apresentada em Requiem, mas revelou que sua reação foi “interessante” e que ele estava “curioso se viagem no tempo estaria envolvida”.
A realidade por trás dessa aparente contradição, contudo, não envolve complexas viagens temporais. A explicação mais aceita e provável é que Resident Evil 9: Requiem está seguindo a linha narrativa estabelecida pelo remake de Resident Evil 3, lançado em 2020, e não a versão original de 1999. O final do remake é notavelmente mais ambíguo em sua representação da destruição de Raccoon City.
No remake, o lançamento da bomba é visto da perspectiva do helicóptero de Jill Valentine, e a cidade é engolida por uma espessa fumaça, não por chamas avassaladoras. Essa mudança visual cria uma “margem de manobra” narrativa, permitindo que parte do horizonte da cidade e alguns de seus marcos, como a delegacia do RPD, pudessem ter resistido ao impacto. Embora ainda catastrófico, o evento no remake não sugere uma aniquilação completa e irrestrita como no original.
Koshi Nakanishi, diretor de Resident Evil 9: Requiem, admitiu que revisitar algumas dessas locações icônicas pode não ser “necessariamente realista”. No entanto, ele confirmou que a equipe realizou simulações físicas para avaliar como Raccoon City poderia ter sido afetada pela bomba, buscando um certo nível de plausibilidade dentro da nova interpretação dos eventos.
Portanto, a presença da delegacia do RPD e de outras estruturas em Resident Evil 9: Requiem é, de fato, um exemplo de retcon (retroactive continuity), uma alteração de elementos previamente estabelecidos na cronologia da série. Essa mudança alinha os eventos recentes da franquia com a narrativa dos remakes, distanciando-se dos jogos originais. Embora a ideia de Leon Kennedy viajando no tempo com um cachecol chamativo seja uma fantasia divertida, a verdade por trás da ressurreição parcial de Raccoon City reside na evolução e reinterpretação da própria história da série pela Capcom.




